Hoje eu vi um besouro na
grama. Ele era verde e estava de pernas para cima. Estava chovendo. Eu estava
sentado próximo a ele, encarando o nada até que meus olhos pousaram nele e não
consegui mais desviar o olhar. Hipnotizado.
Mas é mentira. Na
verdade eu o vi ontem. Eu o vi de pernas pro ar no chão da varanda, se
contorcendo todo, querendo sair daquela posição e não conseguindo. Eu o chutei,
foi instintivo. Não pensei. Viu um besouro de pernas pro ar e o chutei. Mas foi
só um totózinho, assim ele podia se desvirar com a viagem não consentida.
O problema é que ele
continuou do mesmo jeito, só que na grama. Andei até ele e com meu tênis tentei
o mais delicadamente que pude colocar a ponta por baixo. Tentei duas vezes. Não
consegui desvirá-lo. Distraí-me com outra coisa e saí dali.
E agora o coitado estava
ali. De pernas pro ar. Sem se mexer. Um sentimento de culpa começou a se
instaurar em mim. Eu podia ter ajudado aquela pobre criatura. Não o fiz.
Simplesmente o deixei ali, em agonia. E agora estava morto. Ninguém ligava para
ele. Ninguém. De novo: coitado...
De repente minha barriga
começou a reclamar por comida. Tentei continuar ali, refletindo sobre a
situação do inseto, mas a fome era maior. Levantei-me e fui pra cozinha
preparar alguma coisa.
Nunca mais parei para
pensar sobre aquela situação até agora. E infelizmente, depois de eu escrever
isso, vou me distrair com outra coisa e esquecer completamente dele. Só irei me
lembrar caso eu volte a ler isso novamente. Mas cá entre nós, quem iria querer
ler um texto assim?
Conto
de Lucas Beça
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