Pendurado
na parede mais próxima do caixa, o quadro com moldura de madeira e vidro que
protegia o papel A4, impresso por jato de tinta, com fonte Impact e o desenho de
um idoso importado do ClipArt dizia:
FIADO
SÓ PARA MAIORES DE 90 ANOS E ACOMPANHADO DOS PAIS.
Seu
Joaquim não aguentava mais as pessoas pedindo para comprar fiado em seu bar. Já
vendeu muito no passado, mas ninguém pagava e ficou com um prejuízo que quase o
fez fechar o estabelecimento e voltar para Portugal.
Cansado
de tanta insistência, pediu para o filho adolescente redigir o aviso no
computador, imprimir e depois emoldurá-lo na vidraçaria de um amigo seu. Muito
honesto, fazia questão de pagar ao vidraceiro, que era freguês do seu bar.
Um
dia, apareceu um senhor barrigudo e calvo, com ralos cabelos grisalhos na nuca,
aparentando uns sessenta anos. Ele pediu um refrigerante para se refrescar
naquele calor infernal do subúrbio do Rio de Janeiro. Terminada a bebida, pagou
normalmente com uma nota de 50 reais. Enquanto esperava o troco, deu de cara
com o aviso. Riu sozinho. Pegou o troco e foi embora.
Três
meses depois, já no outono, com o clima mais fresco, entrou um idoso, aparentando
noventa anos, se apoiando em uma bengala, que pediu um joelho de queijo e
presunto com mate.
Depois
de comer, procurou Seu Joaquim e pediu:
—
Posso pendurar a conta?
Indignado,
o velho português deixou a cortesia de lado e gritou, apontando para o quadro:
—
Olha o cartaz! Só vendo para maiores de 90 anos acompanhados dos pais.
—
Bom. Eu tenho noventa anos. Está aqui a minha identidade.
—
Mas é lógico que os seus pais já faleceram, não é? Então não tem fiado.
Logo
depois entrou aquele mesmo freguês de sessenta anos do verão, agora segurando
duas cadeiras de rodas. Em cada uma repousava um casal, já bem senil e
delirante.
—
Pai! Fez o lanche? Vamos pra casa que os meus avós estão precisando tomar
banho.
—
Fiz sim. Antes, me deixa apresentá-los ao dono do bar. — Olha aqui, senhor:
estes aqui são os meus pais. O Seu Jerônimo tem 120 e a Dona Mariquinha 115.
Posso pagar fiado, né?
Os outros frequentadores do bar caíram na
gargalhada. Surpreso e sem graça de inventar outra desculpa, Seu Joaquim deu o
lanche de graça para o idoso.
—
Ora, pois! Não precisas pagar. É uma
cortesia.
—
Não. Eu pago com o maior prazer. Estava só brincando.
—
Então paga depois. Se não voltares ficas
como cortesia.
—
Tudo bem, obrigado.
Seis
meses depois, o senhor de sessenta anos, novamente sozinho, retornou ao bar
para pagar a dívida do pai, que já falecera.
—
Ó, está aqui o pagamento daquele lanche do meu pai. Infelizmente, ele já se
foi. Mas os meus avós continuam
vivinhos. Hoje mesmo é aniversário do meu avô, que está fazendo 121. Vamos
fazer um churrasco e você está convidado.
Seu
Joaquim aceitou o dinheiro, agradeceu o convite, sorriu e atendeu outro freguês
depois que o senhor foi embora. Na semana seguinte estava pendurado um novo
cartaz:
FIADO
SÓ PARA MAIORES DE 120 ANOS E ACOMPANHADOS DOS AVÓS.
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