Um rapaz espera o ônibus que o levará para casa depois de um
longo dia. Teve que ficar mais tarde para ajudar na limpeza da lanchonete em
que trabalha e perdeu a carona pra casa.
Ali, sozinho, às onze horas da noite, no ponto de ônibus, ele
desviava o olhar em busca de alguma atividade suspeita. Os carros paravam no
semáforo e sua imaginação começava a trabalhar. Já se via no porta-malas de um
carro encardido indo pra não se sabia onde.
Ele olhava no relógio e tentava respirar fundo. Havia apenas
uma senhora com uma bengala resmungando na outra ponta do banco. Ela se
transformava em uma bruxa e tirava de sua bolsa um líquido gosmento e jogava
nele. Ele estremeceu quando a imagem passou por sua cabeça.
Onze e três, onze e quatro, onze e cinco... Cada minuto
demorava uma eternidade para passar. Ele não sabia que horas passaria o próximo
ônibus. Tentava não pensar em coisas ruins. Mas não conseguia.
Passou a ouvir mentalmente suas músicas favoritas. Seu
cachorro tinha mastigado seu fone e ainda não tinha dinheiro para comprar um
novo. Também não adiantou. As únicas canções que vinham a sua mente eram
tristes.
Ele acabara de fechar os olhos para lembrar alguma música
alegre quando um toque em seu ombro quase resultou em um ataque cardíaco. O
cheiro de álcool e fedor de não tomar banho inundou o seu nariz. Arregalou os
olhos e pôs a mão no coração acelerado.
Em sua frente estava um bêbado infeliz de pernas bambas.
“Ô menino... Não dá pra arrumar dois real, não... ?”
O bêbado fechou os olhos e foi caindo em cima do rapaz.
Conseguiu apoiar-se no banco. O rapaz se encolheu e continuou com os olhos
arregalados, quando o indivíduo se apoiou em seu ombro e começou a vomitar.
Depois de se limpar com a manga de camisa, lentamente o
embriagado sentou-se ao lado do rapaz. Ele tentou se afastar e quase caiu no
chão.
“Desculpa, moço... Mas me arruma só dois real, vai...”,
disse o bêbado e deu um sorriso desdentado. A barba suja não ajudava em nada
sua aparência.
“N-n-não posso. S-s-só tenho o dinhier-r-ro da passagem.”
O rapaz estava tão assustado que gaguejava.
“Íh! É gago! Há-há! Desculpa, desculpa. Por favor,
estou te pedindo...”
O ônibus acabara de parar na sua frente. Se não fosse a
senhora dar o sinal, passaria e ele teria que esperar pelo próximo. Isso se
tivesse um próximo.
Ele saiu correndo de perto do bêbado e entrou no ônibus.
Após se sentar, todos se afastaram dele por conta de seu novo aroma.
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