Não fui eu quem
construiu essa cidade. Sou um mero habitante que caiu aqui por acidente, pela
ilusão de que aqui tudo acontecia; de que as pessoas estavam passando para lá e
para cá, mas que se esbarravam de vez em quando e começavam a conversar entre
si, sem um interesse a mais, sem outra intenção.
Caminho pelas ruas de
São Paulo e apenas sinto o vazio dessa falta de interesse coletiva. As palavras
na ponta da língua, mas que não passam do bom dia, boa tarde, boa noite, tudo
bem, como vai, você tem na cor vermelha, pode ser coca mesmo, dois bilhetes,
por favor, essa é a fila pro ônibus, tchau, brigado...
Andar de carro é ainda
pior. Encarando os faróis do carro da frente, os malabaristas nos faróis, as
pessoas pedindo por um real para comprar um pão que se transforma em uma
garrafa, as buzinas, a pressa para ganhar alguns segundos, segundos que vão
simplesmente gastar vidrados em alguma tela de celular, esses que fazem tudo
menos aquilo que seus irmãos presos à parede de casa por um fio foram feitos
para fazer.
Talvez eu esteja ficando
velho demais. Mas eu nasci velho. Um velho que olha para tudo aquilo que está
sendo feito em sua volta e se sente ao mesmo tempo inútil e aliviado por estar
apenas andando pelas ruas dessa cidade, e não a construindo e a carregando
sobre as costas.
A qualquer momento eu
posso entrar na rodoviária, comprar uma passagem e ir embora. Todos os dias eu
acordo com esse pensamento. Todos os dias eu subo as escadas rolantes da
rodoviária e ao invés de continuar, eu paro no meio do caminho para comprar um
bilhete para o metrô. E continuo nessa cidade.
Conto
de Lucas Beça
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