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Conto
de Gustavo do Carmo
Além de não querer que a
namorada sofresse com as suas manias, Albano morria de medo de ser mal visto
pela futura sogra por não trabalhar e depender do dinheiro do pai. Assim, resistia
a assumir um relacionamento mais sério.
Até que conheceu e foi
fisgado por Lorraine, filha única e órfã de pai. Albano citou todas as suas
manias, como mudar de canal da televisão toda hora, nunca frequentar missas ou
cultos, boates e academias de jeito nenhum, cortar as unhas com a própria mão,
entre outras. Ele também tinha vergonha de não ter nenhuma experiência
profissional.
— Não se preocupe com isso.
Vou dar um jeito.
Esse foi o primeiro problema
que Lorraine resolveu. Pediu para o seu tio Lair arrumar um emprego para o
namorado. O senhor, bondoso e influente, conseguiu uma vaga de redator na
agência de publicidade de um amigo para Albano, que agarrou com unhas e dentes
a oportunidade, tornando-se um ótimo profissional.
Albano finalmente realizou a
sua tão sonhada independência financeira. Enriqueceu e pôde pedir Lorraine em
casamento. Com o noivado, não teve escapatória: ele precisava conhecer a sogra,
que era viúva.
Durante um ano de namoro, Albano sempre arrumava uma
desculpa para adiar o encontro com a mãe de sua amada. Lorraine compreendeu o
medo do namorado, assim como todas as suas manias.
Dona Lourdes cobrava a
filha.
— Você não vai me apresentar
o seu namorado não, minha filha? Até o seu tio Lair o conhece e eu não.
— Eu já tentei. Mas o Bano é
muito tímido.
A senhora aceitou a primeira
desculpa, mas voltou a cobrar no mês seguinte.
— Mãe, vou te contar a
verdade: ele tem medo de conhecer a senhora! O Bano acha que a senhora não vai
gostar dele.
— Ah, ele não deve é ser boa
pessoa. Onde já se viu? Ter medo de conhecer a sogra.
— Claro que já se viu. As
sogras são sempre temidas pelos maridos.
— Ele deve estar tramando algum
golpe do baú, isso sim! Tome cuidado!
— Deixa de bobagem, mãe! Já
não lhe disse outra vez que o Albano é muito tímido?
— Então ele deve ser um bobo.
Se afasta desse tipo de gente.
— Se fosse bobo ele não
faria tanto sucesso como publicitário.
Dona Lourdes encerrou com uma
rosnada contrariada. Já Lorraine, pela primeira vez, cobrou o noivo para
conhecer a sua mãe.
— Amor, por favor! Você tem que conhecer a minha mãe. Ela já está
desconfiando de que você não presta.
— Poxa, Lô. Eu estou
tentando criar coragem.
— Pois então crie! Se não
criar a gente termina o namoro por aqui! Disse Lorraine, pela primeira vez
furiosa com Albano.
— Do que ela gosta, então?
A partir daí, Albano pediu
um dossiê sobre a sogra para a namorada: do que ela gosta, do que ela odeia,
dos assuntos que deve conversar, dos assuntos que ele deve evitar. E Lorraine
disse tudo. A mãe era religiosa, adorava
receber flores, gostava de dançar e era viciada em cupcakes.
Para a tão esperada
apresentação, Albano levou um buquê de flores e uma caixa de cupcakes de chocolate com creme de
maracujá fresquinhos, comprados no shopping perto da casa de Lorraine. A noiva
não tinha falado sobre as preferências de sabor e nem de marca do doce. Dona
Lourdes ficou satisfeita de imediato. Albano não deu margens para desconfiança.
A senhora encantou-se pelo genro de imediato.
Ele aproveitou e pediu para a sogra a mão de
Lorraine em casamento. Dona Lourdes, claro, aceitou e depois disse para a filha
que o genro era muito romântico.
Albano também descobriu um
assunto que Dona Lourdes adorava: histórias. Contou várias sobre a sua família.
Os dois passaram horas conversando. Tantas horas que o cinema que ele iria com
Lorraine ficou para outro dia. Depois outro, depois outro. A cada dia Albano
conversava mais com Dona Lourdes do que namorava Lorraine.
Em uma das visitas, Albano
levou uma caixa cheia de fotos antigas. De novo, ficaram horas conversando. No
domingo, ele passou a acompanhar a sogra na missa. Para ciúmes de Lorraine, que
ficou sobrando na relação, e da mãe de Albano, Dona Adelaide, que reclamou com
a nora que o filho nunca ia à missa com ela.
Dona Lourdes retribuiu o
carinho e passou a mimar o genro cozinhando seus pratos preferidos, como
capeletti, bife mal passado com batatas fritas e arroz com feijão vermelho.
Também dava presentes como livros e miniaturas de carros. Lorraine, claro,
continuava com ciúmes. Dona Adelaide idem, pois Albano quase não almoçava mais
em casa.
A agência de publicidade
onde Albano trabalhava foi vendida para um grupo paulista e ele foi demitido. O
casamento, antes certo, ficou fora dos planos. Lorraine passou a usar o
desemprego do noivo para envenenar a sua relação de amizade com a sogra.
— Mãe, você aceita um genro
desempregado?
— Normalmente não. Mas o
Albano eu aceito porque ele é um bom rapaz e vai conseguir outro emprego logo.
A relação começou a esfriar.
As manias do rapaz também passaram a incomodar a moça. Lorraine e Albano
começaram a discutir com frequência.
Dona Lourdes usava panos
quentes:
— Calma, minha filha. Não
seja tão intempestiva! Ele está nervoso por causa do desemprego!
— Ele nem está procurando
emprego!
— E adianta procurar? As pessoas
só conseguem emprego indicadas.
— E ele também está dando em
cima de outra mulher na minha frente.
— Você está com tanto ciúme
do seu sentimento de mãe pelo Bano que já está vendo o que não existe.
Um dia, revoltada, depois de
mais uma missa em que ficou sobrando na conversa, Lorraine apelou:
— Você decide, Albano: ou eu
ou a minha mãe! Você está tendo um caso com ela?
— Claro que é você, amor! Eu
não tenho culpa de que ela gostou de mim!
— Mãe, você está dando em
cima do meu noivo?
— Que isso, minha filha!
Olha o respeito! O Albano é o filho homem que eu nunca tive.
Dona Lourdes nem era mulher
atraente. Já tinha 70 anos, cabelos brancos e era gorda. Ela ficou uma semana
sem falar com a filha por causa das acusações injustas de roubar o namorado da
filha. Dona Adelaide, mãe de Albano, fez o mesmo com o filho quando descobriu
que ele ia à missa com a sogra e iria a um baile da terceira idade com a sogra.
Já Lorraine terminou o noivado. Foi a gota d’água.
O casamento já estava esquecido
e as manias de Albano insuportáveis. Lorraine tirou a aliança do dedo e a jogou
fora. Voltou a frequentar as danceterias e a academia. Não que o namorado
tivesse proibido, mas ela tinha evitado os lugares que ele odiava para
agradá-lo. Agora estava livre para fazer o que quisesse.
— Está satisfeita, mãe?
Terminei tudo com o Albano! Ele agora é todo seu! Desabafou outro dia.
— E quem disse que eu queria
ele?! Eu só o papariquei para testar a sua fidelidade! Se encantou tanto por
mim que esqueceu de você. Depois que vocês terminaram, nunca mais me procurou! E
ainda se acomodou com o desemprego! Esse
tipo de homem não presta! Além disso está obeso, tem umas manias chatas e ainda
é porco!
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