Apartamento


Ele não estava apaixonado por ela. Não se permitia deixá-la saber o porquê de continuarem juntos naquele apartamento. Talvez ele nem saiba. Ainda.


A senhora saiu do apartamento e ficou paralisada. Não sabia o que estava fazendo ali. Quem era. Onde estava. Apenas ficou ali. Parada. Desesperada por dentro.


O homem deixou sua mulher na porta da academia e foi trabalhar. Ao voltar para casa deparou-se com sua vizinha parada, olhando para o nada, em cima do capacho. Ao passar pela vizinha disse um boa noite baixinho de praxe e entrou em seu apartamento.


“Nossa amor, para de ser tão insensível. Ela era uma mulher tão bacana. Coitada.”

“Tá, então me diga: quantas vezes você conversou com ela nesse tempo todo que você tá morando aqui?”

“Ah... Eu não sei, não sei. Mas isso não é importante. Não deviam ter internado ela. Coitada...”


Subiam no elevador.

A loira do último andar o olhou com segundas intenções.

“Oi.”

“Oi”, ele respondeu.

Ele olhou para cima, como todos quando estão dentro de um elevador.


“Acabou o café.”

“Foda-se”, disse ele.

A mulher arregalou os olhos.

“C-c-como é que é...?”

“É isso aí. Tô pouco me fodendo pra porra do café.”


Brigaram. Ela o expulsou de casa. Ele entrou num bar e pediu uma caixa de cerveja. Enquanto ele tomava a primeira, as outras foram perdendo o gelo.


Não implorou para voltar.


Bateu na porta da loira. Ela atendeu.


Em todos os anos em que os três moraram no mesmo prédio, encontraram-se no elevador apenas três vezes. Mas todas as vezes que um deles apertava o botão, torciam para que os outros dois não estivessem lá dentro.


A senhora nunca mais saiu do asilo. A ex-mulher nunca foi visitá-la, mesmo dizendo que iria.


Conto de Lucas Beça

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