Almoço


Oito horas por dia, cinco dias na semana, duas horas para almoçar. Com o salário que eu ganho e mesmo com o vale-refeição não dá para escolher um restaurante bom para almoçar todos os dias. Isso fica para o fim do mês quando me dou ao luxo de comer melhor do que nos outros dias. Enquanto esse dia não chega o jeito é me satisfazer com o self-service.


Não estou dizendo que a comida daqui não é boa, não é isso, não é nada disso. Não comece a pensar que eu sou uma mulher que gosta de reclamar. Tenho alguns amigos que diriam que isso seria até um pleonasmo, mas são homens, então não dá para levar muito a sério. O que eu estou falando é uma verdade e falo da rotina.

Escute:

Existem dois filhos diletos da rotina. O cômodo e o tédio. E tem vezes que você nem consegue diferenciá-los.

O que eu estou querendo dizer é que com o passar dos tempos essa rotina aqui nesse lugar se mescla e se torna uma forma só. Depois de um tempo não importa quantos ingredientes diferentes sejam usados nos pratos, nem quanta variedade eu possa colocar a cada dia, alternando, não importa. A comida terá o mesmo gosto e o mesmo cheiro. O ambiente inteiro terá o mesmo odor e a mesma sensação.

O prazer de comer se torna apenas fome. Mastigar e engolir se tornam parte de todo o processo tedioso do funcionamento de seu corpo. Você trabalha, come e caga e essa é a sua vida. E eu estou aproveitando cada segundo desperdiçado.

Ana, você bebeu?

Claro que não. Se eu aparecesse embriagada no trabalho, adeus à minha cara maquiagem.

O que estou fazendo aqui é resultado direto do tédio: estou divagando.

Mas bem, não estou aqui para contar do almoço. Estou aqui para falar daquele cara.

Eu frequento esse lugar há 3 anos. Meu Deus, 3 anos. Um mesmo dia vem se repetindo durante esses 36 meses, a cópia amarelada da cópia amarelada. Uma tristeza caiu em cima de mim agora, como um manto pesado do qual tenho dificuldade de sair. Mas vou prosseguir.

Esse cara, ele passou a frequentar aqui há uns, o que? Seis meses? Acho que sim. De outra forma eu já o teria notado há bastante tempo.

Ele senta sempre no mesmo lugar. Tenho impressão de que ele chega cedo justamente para pegar esse lugar que fica ao lado da janela, a janela de onde se tem a visão de uma grande livraria. Eu procuro sentar sempre em um lugar que dê para ver seu rosto. Religiosamente ele está ali todo dia para almoçar e segue rituais exatos como se tivessem sido ensaiados por décadas. Vou lhes dar um exemplo, mas antes preciso descrevê-lo.

Ele tem o rosto vermelho de quem vive muito exposto ao sol ou embriagado. Seus óculos de aro negro vez ou outra estão na ponta de seu nariz devido à oleosidade de sua pele e ele costuma pinçar um lado para o erguer. Seus cabelos são cacheados e desgrenhados, mas fixos. Eu acho que não seja gel ou creme, mas sim a camada oleosa nos fios que o faz parecer sempre molhado. Tem mãos aracnídeas, ossudas, dedos longos e finos. Imagino que com uma mão só ele poderia segurar e fechar meu pescoço. Os olhos por trás das lentes não tem brilho, não tem vida. Parecem ter sido drenados por muita tristeza antiga.

Quem me ouve acha que eu sou uma perfeita stalker, mas na verdade, além de observadora, ficou fácil, depois de tanto tempo essa cena se repetir, fixar na memória esses detalhes. Eu sempre dei preferência a prestar atenção aos atos das pessoas e não somente suas palavras. O corpo das pessoas sempre revela a verdade mesmo quando elas mesmas estão mentindo.

Estou descrevendo ele porque fisicamente não é um homem atraente. O que me fascina nele é a ritualidade de seus gestos. Sempre, todos os dias, ele parece uma cópia exata e animada do dia anterior.

Ele não faz o seu prato, como eu. Ele pede o que está em um cardápio. Certamente seu salário tem um ou dois zeros a mais que o meu. E o interessante é que de segunda a sexta, cada um desses cinco dias corresponde a um prato específico. Nunca muda, nunca nada é acrescentado ou subtraído. O mesmo prato, no mesmo dia, cada semana. Como por exemplo, na segunda-feira. Nesse primeiro dia útil ele pede risoto de camarão, legumes cozidos no vapor, purê de abóbora, filé de peixe à milanesa. Acompanhados de coca-cola zero. E essa é a única coisa que se repete durante os cinco dias em que ele almoça aqui: a coca-cola zero, com gelo e limão.

O garçom está se aproximando dele apenas para depositar em sua mesa um copo de água com gás e gelo. Isso faz parte do ritual, é o que o inicia. O garçom está tão acostumado que já sabe de cor qual o prato de hoje.

Enquanto espera, o nosso cara beberica a água espumante olhando pela janela. Eu estou empalando uma almondega em meu garfo e mastigo enquanto o observo. Eu consigo fazer com que molho caia no meu pulso e chupo a minha pele.

O garçom volta com o prato do dia do nosso amigo.

Tem uma criança fazendo birra em outra mesa próxima à saída. Ela esperneia não querendo as garfadas que a mãe lhe dá e essa mulher e o seu marido parecem dois zumbis, olheiras profundas e olhar vazio. Eles agem mecanicamente e, diante do pequeno espetáculo que sua cria está fazendo, eles parecem tão resignados que não ligam. Isso me irrita e muito. Uma faísca se acende no meu peito e sobe até meu cérebro, o incendiando, essa sensação que eu sempre tenho quando esperam que eu ache alguma criança fofa. Talvez seja por isso que não quero ter filhos.

Por favor, não volte a me achar a mulher reclamona. Só estou pensando alto novamente.

Mas voltemos ao nosso cara.

Ali está. A refeição de hoje, quinta-feira: dois medalhões altos de carne de porco envernizadas por molho madeira, arroz à grega, purê de batata, salada agridoce e a boa e velha coca-cola zero, com limão e gelo flutuando no líquido negro.

Eu salivo e posso até sentir na língua a carne suína e sua maciez se desfazendo e causando tesão em minhas papilas gustativas, mas o que eu coloco na boca é um naco de cenoura cozida em manteiga.

Eu engulo, mas é em seco.

Das profundezas de minha memória uma frase de Bernard Shaw é narrada com a voz de Sir Christopher Lee: “O álcool é um anestésico que nos permite enfrentar a cirurgia da vida”. Contrariando a mim mesma, eu chamo o garçom e peço uma cerveja larger.

O cara que observo começa o seu teatro. Preste atenção, o que ele fará agora é exatamente o que ele fez nos últimos seis meses, o que ele fará nos próximos seis meses, acredito. Não, eu não estou exagerando. No início achei engraçado, mas depois de um tempo a curiosidade se tornou admiração.

Ele é canhoto, então o copo está de seu lado esquerdo. Ele deixa garfo e faca em linha reta um com o outro. Potes de sal e pimenta alinhados ao lado do suporte para guardanapos. Ergue os ombros para deixar seu corpo ereto e o que ele faz agora é colocar os cotovelos na mesa, entrelaçar os dedos na altura de seu queixo, fechar os olhos e conduzir uma breve oração. Dá para ver seus lábios se movendo sutilmente.

A minha admiração é pela disciplina desse homem. A impressão que tenho é que se ele deixar passar ou pular um só passo de seu ritual, não só sua cabeça, mas tudo ao seu redor pode entrar em colapso.

Talvez eu tenha esse fascínio porque minha vida é a própria bagunça. Eu não sou boa com horários, meu guarda-roupa parece que alguém começou a jogar peças de roupa nele com raiva, não consigo organizar meus livros e…

Opa, minha cerveja chegou.

...a única coisa de que posso me orgulhar na minha vida é que minhas contas estão em dia. De resto, até relacionamentos, eu não sei lidar bem com nada. Então ver esse homem, com seus atos cuidadosamente executados, seus dias calculados com precisão, sinto a inveja ser injetada em mim e correr nas minhas veias.

Ele corta um pedaço da carne de porco e coloca na boca, pega uma garfada com arroz e purê misturados e coloca na boca, depois pega a salada e coloca na boca. Mastiga como se realmente estivesse contado 43 mastigadas necessárias para que o alimento seja bem digerido pelo seu estômago, poupando ao pobre órgão um trabalho a mais. Em seguida, depois de engolir toda a maçaroca religiosamente mastigada, ele bebe um longo gole de sua bebida.

Seu pomo de Adão sobe e desce.

Ele repete isso, os mesmos movimentos cadenciados, até tudo acabar. Entre engolir a coca-cola e voltar a colocar comida na boca, uma olhada breve para a livraria do outro lado da rua, nada mais.

Tendo decorado isso há muito tempo, você poderia me perguntar “Por que ainda continua olhando?” e eu posso responder “Acho que tenho a esperança de que ele erre alguma coisa, que aconteça algo de novo. Talvez eu espere que ele tenha um aneurisma, um ataque cardíaco, um engasgo que o leve a sufocar em seu próprio vômito e deixe todo o seu ritual pela metade. Talvez eu queira saber se o mundo continuaria sendo mundo se, por algum motivo, todo esse culto na hora do almoço não ocorresse do mesmo jeito”.

As bolhas da cerveja fazem cócegas em minha garganta e o gás escapa de minhas narinas.

Me pergunto como será a casa desse homem. Se tudo foi planejado para o seu dia, se todas as coisas estão no lugar certo, imóveis pela eternidade. Um feng shui pessoal beirando o divino.

Não, não é a cerveja, eu não estou ficando bêbada ou louca. Esses são os mesmos pensamentos que tenho desde que comecei a prestar atenção na forma ritualística desse homem agir.

Agora ele vai colocar os talheres do lado esquerdo, dentro do prato, o copo vazio ao lado deles. Vai pegar um guardanapo, limpar os lábios gordurosos, então dobrar o guardanapo, limpar mais uma vez, dobrar novamente e o depositar no meio do prato, um quadradinho perfeito e branco.

Viu? Eu falei. É sempre tudo do mesmo jeito.

Eu já terminei e estou só aproveitando minha cerveja, contendo o desejo de pedir mais uma.

O garçom se aproxima dele. Sim, existe uma cronologia exata em tudo o que acontece aqui. Ele chega e senta no seu lugar, o garçom traz sua água gaseificada com um “boa tarde” amistoso, em seguida seu prato do dia é servido, ele come e assim que deposita o guardanapo no prato, o garçom surge com a máquina de cartão.

Eu contando assim parece absurdo, mas juro que é tudo verdade. Uma vez até olhei para os lados com a intenção de encontrar alguma câmera de vídeo, pois tudo parece dirigido por algum cineasta.

Ele paga o almoço com seu cartão de débito, um escuro. O garçom se retira, levando consigo o prato, os talheres e o copo, mas nosso cara não dá a sugestão de se levantar, isso porque ainda não terminou.

O garçom volta com uma xícara de café, cortesia da casa, e deseja uma boa tarde. Nosso amigo abre dois sachês de açúcar, gira o líquido com uma colherinha de plástico, dobra os sachês vazios e os uni, colocando no pires, então começa a beber o café, olhando para a rua. Quando termina, ele coloca os cotovelos na mesa, junta as mãos na altura do queixo, fecha os olhos e faz uma oração mais breve ainda, levantando-se em seguida e deixando o restaurante, para só aparecer na minha vida no dia seguinte.

Esse homem, ele é o próprio retrato vivo do conformismo. A aceitação de todas as coisas se derrama por dentro dele, quente, doce e enjoativa, com uma viscosidade que deixa seus movimentos lentos. Talvez isso faça mal a ele, mas de maneira nenhuma o demonstra.

Termino minha cerveja.

Vou até o caixa pagar tudo e suspiro profundamente quando atravesso a porta e o ar da rua atinge meu rosto. Me pergunto o que estou fazendo da minha vida quando meu passo vacila, meu pé não encontra o próximo degrau e eu afundo.

Eu caio.

Eu rolo quatro degraus com uma dor terrível no tornozelo.

Dois rapazes me ajudam, eu com o rosto vermelho de vergonha. Um deles segura o meu flanco e percebo que um dedo sem vergonha desliza sobre a curvatura de meu seio, mas a dor é tanta que eu não ligo para isso. Eles perguntam se estou bem. Digo que acho ter torcido o tornozelo. Ainda existe gentileza nesse mundo e eles chamam um Uber para me levar a um hospital. Enquanto espero ser atendida, ligo para o trabalho e digo o que aconteceu. Os rapazes gentis já se foram. Uma médica com feições anfíbias me atende e me dá um atestado de 3 dias, um negócio estranho para eu calçar meu pé e um sorriso de quem está com diarreia.

A gente costuma reclamar da rotina. Se ela não muda ou se ela muda. Nunca estamos satisfeitos.

Com a mudança de minha rotina algo pareceu romper-se no espaço-tempo. Um dia, eu acreditava, de mudança, seria suficiente para me deixar louca. Três dias, pelo jeito, me devolveriam a sanidade.

Com a perna esticada e apoiada em cima de um pufe, eu vou buscando na Netflix algum filme ou série que me agrade para assistir, mas falho miseravelmente. Vou para o Youtube e deixo rolar uma playlist de rock dos anos 80, enquanto vou deixando meus dedos e boca engordurados de coxinhas de frango fritas que vieram numa caixa de papel.

Me inquieta ficar aqui apena acumulando células mortas da minha pele.

O sol levanta todos os três dias que passo em casa e também o domingo, então sei que o cara no restaurante manteve seu ritual em dia, até mesmo em sua casa. Seria ele um semideus enviado para manter esse equilíbrio no mundo, ou condenado a repetir esse ato ad aeternum em favor de nossa raça?

Ok, dessa vez você pode colocar a culpa no álcool, afinal essa já é a terceira latinha.

Estou me sentindo uma inútil, felizmente amanhã volto para o trabalho. Meu tornozelo já está pronto para out...não, deixa para lá.

Há uma coisa que eu preciso te dizer: se você está esperando por um plot twist ao final dessa história, lamento, mas acho que não terá. Isso é só uma história idiota sobre uma mulher entediada que fica observando um homem que, no mínimo, deve ser virginiano, com seu perfeccionismo exagerado, ou pior, algum religioso dogmático.

Então vamos lá.

Hoje eu voltei ao trabalho. O tempo parece propositalmente passar lentamente enquanto eu olho para o relógio a cada 10 minutos ansiando pelo almoço. Preciso saber se meu herói continua cumprindo o seu dever.

Rosa Cordeiro, secretária, por alguma razão cruzou o meu caminho bem na hora que me levantei para ir ao banheiro e derrubou em mim uma bandeja com biscoitos de aveia e uma xícara fumegante de café. Minha blusa branca de seda já era. Tive que pedir para sair e comprar uma blusa nova, pois nem eu tenho uma sobressalente nem outra funcionária se dispôs a me emprestar uma.

Quando volto da loja com uma blusa cor salmão e o braço esquerdo vermelho pela queimadura do café, o relógio marca cinco minutos para o meio dia. Então já pego minha bolsa e vou para o restaurante.

Posso imaginar o que você está pensando. Que o cara não está ali hoje.

Bem, você acertou.

Isso me incomodou? Nossa, como isso me incomodou. Um aperto na garganta me acompanhou o resto do dia e o medo de que toda a realidade entrasse em colapso sussurrava aos meus ouvidos. Demônios tramavam em cada sombra.

No dia seguinte. Bem, você acertou de novo. Ele também não veio.

Fiz então a coisa mais óbvia que eu poderia fazer. Chamei o garçom que o atendia sempre.

Sim, era o mesmo garçom que o atendia todos os dias. Não sei se por escolha do próprio cara ou designado pela gerência. O garçom veio até mim com um sorriso um pouco forçado. Eu lhe perguntei se ele sabia o que tinha acontecido com o homem que costumava sentar naquela mesa ali, próxima da janela.

Um suspiro se desprendeu do corpo do homem e minha garganta já formou um nó antes mesmo de ele abrir a boca e falar:

“Ele morreu há três dias, senhora. Depois de almoçar ele não quis o cafezinho, aí quando foi atravessar a rua para ir à livraria uma moto descontrolada o acertou em cheio. A moto estava com problemas e o piloto não pode conter o impacto. Ele morreu ali mesmo, na hora.”

Pedindo licença ele se retirou e com ele foi toda a alegria, mesmo pequena, que eu emanava. Em seu lugar uma tristeza profunda se avolumou ao meu redor, se derramando por todos os cantos, infiltrada, como vazamentos que acontecem nas casas.

Eu não conseguia assimilar aquilo tudo. Mas o que mais me intrigava era justamente o cara ter negado o cafezinho, coisa que ele nunca fazia. Ele quebrou o ritual. Ele não seguiu todas as regras até o fim. Por que? O que o levou a fazer isso? Eu tinha algo a ver com isso? Claro que não, que absurdo!

Olho para todos os lados, como o ponteiro de uma agulha tentando me orientar.

Agora meus temores cresceram mais ainda. Um elo se quebrou, uma linha se rompeu. Eu olho para a mesa vazia e sinto em tudo aquilo que sou que um desequilíbrio adeja ao meu redor. Eu e esse cara, bem, nós éramos como duas crianças de mesmo peso em uma gangorra.

Sim, eu sei que posso estar exagerando sobre isso, mas, bem, e agora? Não espero que você me entenda. Eu estava aqui há seis meses olhando a mesma cena se repetir todo santo dia, diferenciada apenas pelo conteúdo do prato. Como a gente olha uma foto antiga, de quando éramos crianças e esse ato causa em nós tanta coisa que sempre a olhamos para reviver esses sentimentos.

Isso, agora, acabou.

Uma senhora muito idosa passa ao meu lado andando lentamente com a ajuda de uma bengala. Sua respiração é sôfrega e alta, tão alta que eu posso ouvir o ar vascolejar entre as cavernas úmidas de seu interior.

Hoje é segunda-feira. Eu sei bem qual prato ele pediria. Eu chamo o garçom novamente. Peço risoto de camarão, legumes cozidos no vapor, purê de abóbora, filé de peixe à milanesa e uma coca-cola zero. Mas antes quero que ele traga uma água com gás e gelo.

Ele me olha demoradamente. Suas sinapses, eu posso até vê-las brilhando. Seus olhos correm de um lado para o outro me observando e, como se alguém puxasse a linha de seus seus lábios para o lado, um sorriso torto começa a lhe aflorar na boca, unindo-se aos olhos. Ele olha para a mesa onde nosso amigo costumava sentar e depois olha para mim. Eu assinto com a cabeça.

Quando ele sai eu vou até a mesa ao lado da janela, me sento e posso ver a livraria. O garçom me traz a água gaseificada. Eu bebo enquanto olho para o outro lado da rua, estreitando os olhos para fixar numa frase escrita numa vitrine. De onde estou, essa frase está ali sempre no meu campo de visão. Era justamente o que o cara via todos os dias.

Qui nescit dissimulare, nescit vivere” 

Abro o celular e escrevo a frase para traduzir. O resultado é “Aquele que não sabe mentir, não sabe como viver”.

Eu sorrio. Aproveito para ver meu saldo em conta. A partir de agora terei que ajustar meu dinheiro a uma nova rotina de almoço.

O garçom volta com meu prato.

Eu nunca orei, nunca rezei, sequer fui a uma igreja, mas já ouvi e li em filmes e livros como as pessoas agradecem a Deus na hora de se alimentar. Então coloco os cotovelos na mesa, entrelaço os dedos na altura de meu queixo, fecho meus olhos e, bem, vocês já sabem o que vai acontecer daqui para a frente.



Hemerson Miranda


Postar um comentário

0 Comentários