GRINGA NO SAMBA


Conto de Gustavo do Carmo

Em uma viagem a Londres com a irmã e o cunhado, Ariel conheceu Audrey, uma bela inglesa ruiva de seios fartos, aspirante a modelo, que já fez alguns ensaios de calcinha e topless, que não lhe deu muito dinheiro. Por isso, para se sustentar, trabalhava como garçonete no restaurante do hotel onde o turista brasileiro se hospedou.

A primeira conversa de Ariel com Audrey aconteceu quando ele foi pedir uma garrafa de água mineral. Sem entender muito bem o inglês, não compreendeu quando ela perguntou se ele queria água com ou sem gás. “Carbonated or uncarbonated¿”, ela repetiu várias vezes. Cansada de insistir, ela pegou as duas águas e sacudiu as garrafas. Foi aí que Ariel finalmente entendeu e pediu a “uncarbonated” (sem gás).

No dia seguinte, Ariel viu Audrey sair apressada, aparentemente chorando. Foi atrás dela, mesmo contra a vontade da irmã. Conseguiu alcançá-la e perguntou, em inglês, o que aconteceu. Ele entendeu o “I’m fired” (fui demitida). Ainda perguntou: “Why¿” (Por quê¿)

— My boss discovered that I posed naked.
(Meu patrão descobriu que eu posei nua)

Nessa hora, Ariel entendeu tudo em inglês. E se desculpou, temendo levar um fora.

— I’m sorry. I will leave you to cry alone and back to my room.
(Desculpa. Eu vou deixar você chorar sozinha e voltar para o meu quarto)

— No! Wait! Don’t leave me. Drink with me, please!
(Não. Espere! Não me deixe sozinha. Vamos sair para beber, por favor!)

— I need to advice my sister.
(Preciso avisar a minha irmã)

Foi avisar à irmã, que, com razão, não queria deixá-lo sair com uma desconhecida estrangeira. Mas o cunhado interferiu e o incentivou, pois Ariel precisava desencalhar. Autorizado, Ariel e Audrey foram a um pub perto do hotel.

Ao saber que o seu novo amigo era brasileiro, Audrey interessou-se pelo carnaval do Rio de Janeiro, de onde veio Ariel. Ficou com vontade de desfilar na Mangueira. Embora adorasse o desfile das escolas de samba, Ariel afirmou não ter contato com nenhuma escola. Mas ia tentar procurar alguma coisa na Imperatriz Leopoldinense, mais perto de onde ele morava.

Ariel e Audrey ficaram. E transaram na casa dela, que ficava em Nothing Hill. Depois, ela mostrou-lhe algumas fotos de topless que fez. Trocaram contatos. Conversaram por telefone e por chat enquanto ele estava em Londres. Marcaram outros encontros. Oficializaram o namoro. Foi apresentada, inclusive, para a irmã, desconfiada, e o cunhado.

Na volta para o Brasil, Audrey foi com eles. Usou o dinheiro do seguro-desemprego, de um cachê numa revista de ensaio sensual e sua poupança para comprar a passagem.

No Rio, depois dos triviais passeios por Copacabana e Ipanema, Audrey arrastou Ariel para uma favela e uma quadra de escola de samba. Ariel a levou na Mangueira. Não conseguiu nada. As vagas de madrinha de bateria estavam todas reservadas para as mulatas da comunidade. Na Imperatriz, São Clemente, Vila Isabel, Unidos da Tijuca e Salgueiro não tinha vaga no carro alegórico e nem de passista no chão. E a fantasia também era muito cara. Audrey já tinha gasto o dinheiro com a passagem para o Brasil. As madrinhas de bateria eram atrizes de novelas, modelos e funkeiras.

Mulher branca e ruiva, ainda mais estrangeira e sem bunda como Audrey, não é bem vista no mundo do samba. Foi o que o casal ouviu dos diretores e carnavalescos de todas as escolas que procurou, inclusive da Grande Rio e Beija-Flor, últimas a serem procuradas por eles.

Audrey brilhou no sábado de carnaval, desfilando pela Unidos do Peruche, no Anhembi. Foi apadrinhada por um deputado federal carioca radicado em São Paulo, com quem começou a namorar e de quem já estava grávida. Largou Ariel, que não tinha nenhuma influência no samba, muito menos maturidade pessoal, e ficou chupando dedo, ouvindo sermões do pai e da irmã no carnaval, que jogou na sua cara que tinha avisado que a moça inglesa era oportunista e interesseira, mas ele não a ouviu.

Audrey foi a única mulher a desfilar de topless no carnaval, mas Ariel fez questão de não ver, pois odeia São Paulo e agora também detesta carnaval.



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