“Ah, sei lá, vamos fazer
outra coisa. Todo dia TV, TV, TV...”
Foi Vicente que disse
isso a Hugo. Os dois eram colegas de quarto em um apartamento minúsculo em São
Paulo. Não saiam muito e todos os dias acabavam caindo no buraco negro que era
a caixa mágica – eles ainda não tinham dinheiro para comprar uma TV de LCD.
“Tá, mas o que você quer
fazer? Jogar dama, xadrez...”
“A gente pode jogar
baralho.”
“Não dá, tá faltando
cartas. A minha sobrinha comeu.”
“Comeu?”
“Comeu, jogou da janela,
sei lá...”
Os dois ficaram em
silêncio, pensando no que fazer.
“E se...”
“Não...”
“É, você está certo...”
Hugo levantou-se em
direção à cozinha pegar uma cerveja.
“Fica aí pensando,
camarada.”
“Traz uma pra mim
também.”
Hugo fez cara feia, mas
Vicente não viu. Estava encarando o nada pensando em algo a fazer. Com as
cervejas em mãos, os dois as abriram.
“Vamos conversar”, disse
Vicente, inocente.
“Simples assim, só
conversar?”
“É.”
Hugo deu um baita gole e
pegou o controle.
“Mas...”
“Cala a boca, Vicente.”
“Tá, mas eu que escolho
o canal.”
Conto
de Lucas Beça
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