Era a primeira vez que reencontrava
o ex-marido após a assinatura do divórcio. Foram casados por apenas dois anos,
mas namoraram durante quase vinte, quando Andrea e Fábio ainda estavam na
adolescência. Agora Andrea é noiva de Cornélio, um jornalista que conseguiu o
seu primeiro emprego de repórter cultural aos 35 anos, indicado por um
ex-colega de faculdade.
Cornélio e Andrea
conheceram-se na revista onde ele trabalhava como repórter. Ela, fotógrafa.
Começaram a namorar três meses depois dele chegar à revista. No ano seguinte já
marcaram o casamento.
Mesmo trabalhando como
jornalista, Cornélio era muito tímido. Só falava o necessário com os colegas e
o diretor da revista, amigo do seu ex-colega. Entrevistava as personalidades culturais
com muito respeito. Com muita educação. Até exagerados.
Com essas duas qualidades
conquistou Andrea, que investiu no novo namorado, um ano depois de se separar
de Fábio. Aliás, ela era a única amiga dele na redação da revista. Cornélio
tinha esse nome feio, mas possuía uma beleza simples. Era um pouco barrigudo,
moreno e de estatura média. Andrea
também tinha uma beleza normal. Loura, alta, seios pequenos e quadril um pouco
largo.
As famílias dos dois
jornalistas já se conheceram. O carinho e a boa receptividade eram recíprocos
nos dois lados. Cornélio adorava a lasanha da sogra e Andrea o estrogonofe da
mãe do noivo. O namoro dos dois, porém, não era aceito na redação. As amigas de
Andréa tentavam dissuadi-la a terminar o namoro com Cornélio porque o achavam
muito esquisito e ela merecia um homem melhor, como Fábio.
Cornélio sempre cobria peças
de teatro, lançamentos de livros, vernissages
de arte, pré-estreias de filmes, shows musicais, entre outras manifestações
culturais. Andrea era fotógrafa, mas não da editoria dele. Atuava no Cotidiano.
Mesmo assim, sempre o acompanhava nesses eventos, como sua noiva.
E foi numa premiação de
teatro que ela reencontrou Fábio, dois anos depois do divórcio. Haviam perdido
contato. Ele estava sozinho. Grisalho, alto, forte. Belo e elegante com um
terno Armani. Era mais seguro e decidido que Cornélio. E ainda era rico.
Empresário, dirigia a companhia de telecomunicações que patrocinava o evento.
Se soubesse, Cornélio jamais
teria levado a noiva com ele. Era ciumento, embora não demonstrasse. Sabia quem ele era pelas fotos dele que viu no
seu celular. Percebeu que Andrea ficou tocada pelo reencontro com o ex-marido,
com quem não falou durante o evento.
Ficou abobalhada, derramou
champanhe no vestido, dava-lhe respostas fora do contexto das perguntas, entre
outras distrações. Um sentimento de nostalgia sexual e romântica tomou conta de
Andrea.
A partir de então, Cornélio
passou o evento todo em silêncio, sem puxar um único assunto com a noiva. Só
abriu a boca para entrevistar as celebridades da premiação. Andrea notou que o
noivo percebeu a sua saudade pelo ex. Tentou puxar assunto sobre os bastidores
da festa. Ele fez apenas comentários secos.
Somente em casa, Cornélio
abriu o jogo:
— Andrea, notei que você ficou
estranha depois que reencontrou o seu ex.
— Não, Nélio. Imagina.
Esquivou-se, com medo do noivo agredi-la por uma crise de ciúmes.
— Fala a verdade, Andrea!
Gritou. — Eu não vou te bater, eu não vou te xingar. Você quer voltar pra ele?
Depois de quase um minuto de
silêncio e suspiros, Andrea decidiu.
— Quero sim, amor! Eu estou
morrendo de saudades. O Fábio é mais rico, bonito e seguro que você. Nós dois
trabalhamos e ganhamos pouco na revista. Não quero me casar e trabalhar apenas
para complementar a nossa renda. Quero trabalhar por prazer. Além disso, lá na
redação ninguém te aceita como meu noivo. Todo mundo quer que eu volte pra ele.
Desculpa te jogar essa verdade na sua cara, Fábio. Eu te amo, mas como um
amigo, um irmão.
— OK. Eu já esperava isso.
Acabou o noivado, então. Respondeu Cornélio, antes de deixar a casa que já
havia alugado para morar com Andrea.
Rescindiu o contrato do
aluguel, pediu demissão da revista porque não tinha mais clima para se
encontrar com Andrea e voltou a morar com os pais idosos. Andrea procurou Fábio
através dos seus contatos como jornalista. Reencontrou-o. Viajou com ele. Recasaram-se,
tiveram dois filhos e viveram felizes até ela encontrar um amante, mais forte e
bonito que Cornélio, com quem nunca mais teve contato. Muito menos depois que
se tornou uma fotógrafa premiada e de fama mundial.
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