Cartas para ninguém (33, 34, 35 e 36)



- 33
Eu fui pra São Paulo.
Não quero falar sobre minha visita na casa da minha mãe. Você conhece ela. Sabe como ela é.
Mas uma coisa aconteceu.
Eu estava no metrô e uma mulher entrou pedindo esmola. Ela dizia como a vida estava difícil, que estava sem emprego, os filhos estavam passando necessidade, etc. e tal...
Várias pessoas deram moedas, algumas até notas. Eu tinha um sanduíche que eu tinha feito pra comer na viagem, mas não tive fome, então não comi. Resolvi dar o sanduíche para a mulher.
Ela chegou perto de mim, eu tirei o lanche da mochila, estendi a ela e disse: “Olha, eu tenho esse lanche que eu não comi. Pode levar.” Ela olhou pra mim com uma cara de desdém e falou: “Mas você não tem dinheiro, não?”
Eu fiquei estupefato. Não sabia o que dizer.
O trem parou e as portas se abriram. Ela disse: “Tá bom”, e pegou o lanche da minha mão de má vontade e saiu.
As pessoas que estavam vendo a cena desviaram o olhar quando eu olhei pra elas.


- 34
Decidi que vou parar de fumar.
Comprei um daqueles cigarros eletrônicos e uma caixa de pastilhas.
Achei até um grupo para viciados aqui na cidade. São viciados de vários tipos, mas só de álcool pra baixo. As reuniões dos viciados em drogas pesadas são em um grupo diferente.
Tomara que dê certo.
Você sempre insistiu para eu parar. Dizia brincando que esse era o meu único defeito.


- 35
Eu não consegui arrumar um martelo, então eu comprei um suporte e deixei o quadro de pé na minha mesa.
Te ver ali, sorrindo, me deixa um pouco feliz.


- 36
O Robinson parou de ligar depois que eu contei pra ele que eu estava escrevendo essas cartas.
Ele disse que eu estava ficando louco e simplesmente foi embora.
Me arrependo até o último foi de cabelo por ter contado isso a ele.
Idiota.


Parte 9 do conto de Lucas Beça

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