A jaqueta branca


Um homem sai do provador. Ele para. Analisa a jaqueta branca que ele está agora usando. Dá um enorme sorriso com as sobrancelhas e pergunta para a vendedora da loja:


“E então? O que você achou?”

A moça hesitou um pouco.

Arrependeu-se de ter feito isso. Já era a sétima jaqueta. E todas as vezes que ela hesitava, o homem acabava por provar outra.
          
“Hã... Sim, ficou ótima no senhor.”

“Ah, para com isso de me chamar de senhor. Me chame de você. Fica menos formal, sabe? Você gostou mesmo? Parece que não...”

“Ficou sim.”

Ela dá um sorriso para ajudar.

“Não, acho que você só falou isso pra me agradar e eu ir embora rápido. Acho que você já tá de saco cheio de um velho que nem eu aqui te incomodando, não é mesmo? É que eu estava precisando comprar umas roupas e eu estava me sentindo meio sozinho e resolvi vir hoje mesmo. Eu estou assim desde que minha mulher se divorciou de mim pra ir morar com um cara bem mais novo do que eu lá na Europa. Cara boa pinta, sabe, cheio da grana. Mas fazer o que, né? Melhor do que ficar levando chifre. Ela me pediu o divorcio na primeira vez que foi pra cama com ele. Tecnicamente eu levei chifre, mas foi uma vez, não dá pra ver, né? He, He... Mas depois de um tempo eu comecei a sair de novo, só que aí acabei descobrindo que a velhota era casada. Dá pra acreditar? Que coisa! Só queria me usar. Uma lástima. Mas eu estou bem sozinho, sabe. É claro, tive que aprender a fazer várias coisas de casa, porque agora não dá pra pagar empregada, a ex me tirou quase tudo. Só cozinhar eu ainda não aprendi. Faço café porque a cafeteira faz a maior parte do serviço. Agora eu almoço no self-service lá da esquina da minha casa. É barato pra caramba! Você já foi lá? É na rua Dom Pedro, bem na esquina. Não? Ah, que pena. Mas você devia ir. O macarrão de lá é fantástico. Ai, ai...”

A moça não sabia o que fazer. Não tinha palavras, depois daquela enxurrada de informações que acabara de receber. O homem voltou a olhar a jaqueta.

Humm... Será que eu levo essa? O problema é que ela é branca. Suja muito? Mas é bem bonita, não é verdade? Muito bonita...”

Ele parou para olhá-la mais uma vez. Levantou os braços. Abaixou-os.

“Olha, até que é bem confortável. E é de couro. Parece couro. Como será que eles fazem couro branco? Couro é preto, não é?”

Agora ele estava esperando uma resposta.

“Moça? Está me ouvindo?”

“Ah, desculpa, o que o senhor perguntou mesmo?”

“O couro, como eles fazem o couro ficar branco.”

“Ah, desculpa, eu não sei.”

Humm...

Humm...

Ele ficou pensativo. Foi até o espelho. Olhou de um lado, do outro. Ficou de costas e virou o pescoço para ver...

“Até que combina com o meu sapato.”

“É...”, disse a vendedora fracamente.

“O que disse, querida?”

“Ah, eu disse que combina sim, com o seu sapato.”

“É mesmo, né? E a camisa ficou boa também. Bom, acho que vou levar essas duas mesmo.”

Então o homem entrou no provador para tirar as peças. A moça esticou as costas de tanto ficar ali parada e disse para si mesma:

“Até que enfim.”

“O que foi, querida?”

“Nada não, nada não...”


Conto de Lucas Beça

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