Conto de Gustavo do Carmo
Olhou para o espelho. E viu
o quanto estava gordo. A gordura lateral já pulava para fora. A barriga já
estava imensa.
— Como estou gordo! Preciso fazer um regime
urgente, pensou Apolo.
Mas não fez. Dias antes, já
tinha percebido que estava gordo em uma selfie após a passagem de ano. E outra,
com os pais. Quatro anos antes já tinha percebido que estava gordo quando tirou
uma foto sentado na cadeira de aula de um curso de teatro. E ele já sentia
desconfortável sentado. Das roupas P que vestia, passou a vestir GG, que já estava
apertada. As calças tamanho 38 passaram a 50.
Apolo era magro quando
criança. Daquele que revelava todas as costelas quando posava para fotos
fingindo ser um homem forte. Sua tia viu uma dessas fotos e o comparou aos
meninos pobres da Etiópia.
Teve hipotireoidismo quando
bebê e, segundo a sua mãe, os remédios que tomou o fizeram emagrecer ao nível
esquelético. Até os vinte anos ainda era magro. Seu corpo começou a mudar
quando foi dispensado da endocrinologista infantil. Demorou três anos para
procurar um médico do ramo que atendesse adulto. Com 25 já tinha uma pequena
barriga. Com 30, a barriga já estava maior. Aos 35 a costela já começava a
inchar. Aos 40, o pescoço formava papada quando abaixava.
Apolo também tinha hábitos
nada saudáveis de alimentação. Adorava comer tudo que era gorduroso.
— É mais gostoso, sempre
dizia.
E também era sedentário.
Tinha horror a academias. Mas se dispunha a correr. Desde que fosse à tarde e
acompanhado de uma namorada que ele não tinha.
— Quando eu tiver uma
namorada, corro com ela.
Quando o pai cobrava dieta,
ele desconversava. Quando se irritava, jogava na cara que o velho não parava de
fumar. Mesmo assim, prometia para si mesmo que iria fazer um regime. Mas a mãe
fazia a sua comida preferida e ele repetia. Terminava o almoço empanturrado.
Mesmo assim, ela também cobrava dieta. Apolo dizia estar em depressão e que não
tinha motivação para fazer regime nenhum.
Nem mesmo quando ficou
entalado numa cadeira do restaurante para onde foi com a irmã, o cunhado e o
sobrinho, que ficaram rindo da sua cara. Ficou ainda mais deprimido. Engordou
cada vez mais.
As pessoas só queriam ver Apolo envergonhado e que ele se esforçasse sozinho para perder peso. Mas, entender o motivo da sua depressão e ajudá-lo a superar, ninguém fazia o mínimo esforço.
E com este conto eu encerro a temporada 2020 do Tudo Cultural. Obrigado ao Lucas Beça e ao João Paulo Simões por postarem durante este ano difícil para todo mundo.
No dia 24 ainda posto o conto de Natal e no dia 31 o de ano novo. Mas já desejo logo boas festas em ambas as datas. O blog volta das férias no dia 1 de fevereiro.
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