Conto de Gustavo do Carmo
Recebeu o amigo negro em sua casa
pela primeira vez, desde que fizeram amizade, havia dez anos, num curso de
pós-graduação. Sem experiência em receber visitas suas (só a dos seus pais e
sua irmã), Jonas não tinha nada para servir além de um copo d’água e uma penca
de bananas, sua fruta preferida.
Oscar, que apareceu de surpresa,
acompanhado da esposa, também negra, comentou estar com muita fome. E aí
começou um medo pavoroso de constranger o único amigo que tinha. Na sociedade
politicamente correta, oferecer banana para um negro virou uma ofensa grave,
correndo risco até de prisão.
Jonas começou a pensar como
ofereceria bananas para o casal de amigos, que realmente se incomodava com
insultos racistas. Sua esposa até processou uma mulher na fila do cinema após
uma discussão, na qual durante o calor, foi chamada de suja.
O anfitrião começou um rodeio de
Barretos para oferecer o lanche:
— Oscar, meu amigo, eu sei que
você se ofende com gestos que podem parecer racistas, mas saiba que eu gosto
muito de você e não quero perder a sua amizade por nada neste mundo.
— Quê isso, Jonas? O que houve?
Perguntou Oscar, espantado.
— Juro que não criei essa
situação de propósito. Você apareceu meio de surpresa e eu não tenho costume de
receber visitas. Assim, não tenho nada para a gente comer. Esqueci de fazer
compras essa semana.
— Não se preocupa, a gente pede
pelo aplicativo. Eu pago. Ofereceu-se Olívia, a esposa de Oscar, sacando o
celular do bolso e fazendo o pedido.
— Boa ideia! Não tinha pensado
nisso. Aliviou-se Jonas.
— Mas eu já adivinhei o que você
está sem graça de oferecer. É banana, não é? Perguntou Oscar.
— É. Respondeu Oscar,
praticamente murmurando.
— Aaaaah! Quê isso, Jonas! A
gente adora banana. É a nossa fruta preferida. Tanto minha quanto da
Olívia.
— Sério?!
— Com certeza! Das ofensas
racistas que a gente sofreu a vida inteira, oferecer banana é a única que não
nos ofende. Eu até percebo que as pessoas evitam nos oferecer banana por causa
disso. Uma vez, fui a um churrasco na piscina no verão e percebi que não tinha banana
na salada de frutas. Tive que criar o constrangimento de pedir, mas não me
surpreendi e nem me ofendi quando o dono da festa me perguntou: “Você gosta de
banana? Desculpa, não te ofereci com medo de parecer racismo.”
— Eu como banana desde criança e
minha mãe sempre me chamou de macaquinha, que aliás é o meu apelido carinhoso
de infância. Com um detalhe: ela é branca. E mesmo depois que eu comecei a
entender o racismo, nunca me ofendi por causa disso, embora os meus amigos e
até a minha mãe tenham mudado o apelido pelas razões as quais você ficou
constrangido agora. Só não gosto que critiquem o meu cabelo e me chamem de
crioula ou urubu, que aliás nasce branco. Eu sou crioula, com muito orgulho! E
adotada também.
— E eu sou filho natural de dois
negros e tenho muito orgulho disso! Cresci comendo banana e adoro banana. Como
tudo de banana: seja doce ou salgada. Meu pai só não me chamava de macaco
porque ele não queria que os outros se acostumassem a me chamar assim. Só odeio
quando me chamam de crioulo. E por isso que ainda escolhi uma mulher negra para
me casar e ter filhos. Aliás, viemos aqui para lhe comunicar que seremos papai
e mamãe.
— Parabéns!
Depois dos abraços, Jonas, Oscar
e Olívia comeram frango assado com bananas desidratadas e de sobremesa milk
shake de banana e a própria fruta que o anfitrião ficou com medo constrangido de oferecer.
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