Agora Jorge se encontrava sentado do
lado de fora da casa de Luna. Ela morava em uma rua que dava para o mar, com a
distância de quatro quarteirões, na Praia Grande.
O banco de concreto encostado no muro
da frente era duro, então trouxe uma almofada para se sentar no fofinho. A
calçada áspera preta e branca o deixava com aflição, pois sempre que ouvia o
sapato raspar vinha à sua mente um machucado ralado.
Mas hoje estava bem consigo mesmo. Saíra
do hospício (preferia essa palavra, sem eufemismos), sua filha estava ajudando-o
a se recuperar, ela não fazia controle dos remédios como lá e sentia-se bem por
estar com essa responsabilidade nas mãos, mesmo não gostando dos efeitos que as
pílulas causavam.
Até conseguiu passar na papelaria no
centro e comprar massa de biscuit. Adorou fazer bonequinhos e imãs de geladeira
na sala de recreação. Se produzisse bastante poderia vender as peças na
feirinha de terça-feira.
Foi Luna que pagou. Ela olhava com pena
para o seu pai por estar contente em fazer aquilo.
Ele abriu o jornal e encostou as costas
na parede. Eram sete da manhã e o dia começara bem. O jornaleiro lembrou-se
dele, não perguntou onde estava em todo esse tempo e foi gentil com ele. Talvez
a sua filha o tivesse alertado a não comentar nada.
Odiava quando as pessoas ficavam
insistindo em fazer perguntas pessoais. Comprou um jornal qualquer e depois foi
à padaria comprar alguns pãezinhos para Luna tomar café da manhã. Era o mínimo
que poderia fazer. Mesmo que o dinheiro fosse dela.
Molhou a ponta do indicador e ao virar
a primeira página, começou a ler o editorial. Arrependeu-se, depois de uma
leitura superficial, por comprar esse jornal local de centavos. Havia vários
erros de português. Fechou-o na hora.
Ficou irritado. Cruzou as pernas.
Descruzou. Cruzou novamente. Abriu-o novamente e foi ler a matéria seguinte. Desistiu.
Quando baixou o jornal arregalou os olhos. Atrás do papel uma pequena nave
aterrissou. Não podia ser verdade.
Com muito medo dobrou o jornal e viu um
velho e pequeno conhecido saindo do meio de transporte. Não, não, não! De novo não!, pensou. O pequenino alienígena olhou
para ele, deu uma baforada no charuto que tinha na mão direita e disse
manhosamente:
“E aí, cara, como é que tá? Sentiu minha falta?”
O alien deu um sorriso mostrando todos
os dentes.
Jorge se levantou agitado. Sacudindo os
braços freneticamente. Gritando para o seu antigo companheiro. Aquele que o
levou ao hospício.
“Você de novo! Merda, quando vou parar
de te ver? Será que os remédios não estão fazendo mais efeito? Merda, merda, merda!”
Quando se acalmou sentiu um extremo
alívio. Não havia ninguém na rua para ver o ocorrido. O seu amigo alucinado não
estava mais em sua visão. Jorge deu as costas para o jornal e entrou na casa de
Luna com a almofada.
Segunda parte do conto de Lucas Beça
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