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Ana Paula mal desfez as malas ao chegar e, no dia seguinte, pouco antes de encher a mala com renovadas mudas de roupas, disse a Lenilson, “conheci alguém” e voltou para Minas , onde havia passado alguns dias de férias, sozinha-sem ele - um descanso que resolveram dar ao casal depois de dez anos morando juntos, e conhecera esse alguém na casa da amiga comum que a hospedara.
Lenilson ficou arrasado por um mês, comia pouco, muito bebia e chorava andando pela casa, trocando as músicas alegres pelas tristes, no rádio e no toca-fitas. Nunca a mais de cinco metros do telefone. Três vezes, todos os dias, ligava para Minas, à casa da amiga onde Ana Paula se instalara. Poucas vezes conseguira falar com ela. Acabara de sair - era a resposta, a qualquer hora que liga-se. Quando era ela que atendia, Lenilson percebia o desencanto na voz, pronunciando: “Ah, é você.” “Então? Não vai voltar?” murmurava ele, respirando mal. “Sei lá. Por enquanto, to procurando emprego por aqui”, respondia ela com enfado.
Dois meses depois, quando Lenilson resolvera mudar de emprego, de casa e de atitude, Ana Paula avisou, numa chamada a cobrar, em tom grave. “Vou voltar”
No dia seguinte, ela chegou, jogou as malas na sala, deu-lhe um beijinho na boca e disse “To morta, vou dormir um pouco, depois falamos”. No quarto, trancou a porta.
Na semana que se seguiu, e durante um mês, Ana Paula mal comia e chorava escondida, andando pela casa e trocando as músicas alegres pelas tristes, no rádio e no toca-fitas. As mesmas de Lenilson. E nunca a mais de cinco metros do telefone.
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