O Rio de Janeiro foi fundado
entre os morros do Pão de Açúcar e Cara de Cão, na Urca, Zona Sul. E por lá se colonizou. Os bairros da região mais nobre
assumiram, principalmente nos últimos cem anos, uma importância maior na cidade
do que o próprio Centro, para onde a cidade também se ocupou.
Copacabana, Ipanema, Lagoa, Botafogo,
São Conrado e Leblon se tornaram o sonho de consumo dos moradores dos bairros
da Zona Norte, tão discriminada pela sociedade, formada principalmente pelos
moradores dos bairros da própria Zona Sul, apesar do crescimento da Barra da
Tijuca.
Ok. Ok. Eu sei que nos últimos
dez anos a Barra da Tijuca tem crescido demais e o Centro vem sendo
revitalizado. Sem falar na nova moda das favelas, mas isso é assunto para
depois e o que está em discussão aqui é a eterna paixão do carioca pela Zona
Sul.
A mídia pode estar se mudando
para a Barra e São Paulo, mas o coração carioca ainda está na Zona Sul. Três
das principais emissoras de televisão aberta do Brasil têm suas sucursais funcionando
na Zona Sul. A Band e a RedeTV! (cuja antecessora, a Manchete, tinha um moderno
prédio na Praia do Flamengo) em Botafogo e a Globo, que nasceu no Jardim Botânico, mas já se mudou informalmente para
São Paulo e transformou a sua sede em sucursal.
A Record do Rio está baseada em
Benfica, o SBT em São Cristóvão e a TV Brasil no Centro. Mas se acontece algo
de importante na Zona Sul, como uma enchente que atrapalha milhares de
moradores da região, elas vão na onda da Globo que transforma esse algo em um
acontecimento para toda a vida e todas priorizam a Zona Sul. O RJTV da Globo
tem fetiche por mostrar o trânsito da Zona Sul.
A prefeitura lança seus novos
projetos viários, como o BRS, bicicletas comunitárias, ciclovias, proibição de
vans e agora o sistema automático de vagas de estacionamento, que pretende
eliminar os flanelinhas, na Zona Sul. O choque de ordem, que não deu em nada,
ficou só na Zona Sul. Até os mobiliários urbanos daquela região são mais
bonitos e modernos. O banheiro público automático sofisticado, que não deu
certo, foi lançado lá. O governo estadual só reforça a segurança na Zona Sul.
Grandes artistas cariocas que já
morreram estão enterrados na Zona Sul (no cemitério São João Batista, em
Botafogo). Quando ainda vivos, a maioria
mora na Zona Sul. Jogadores de futebol que crescem na carreira compram logo um
apartamento na Zona Sul. Os que vêm de longe alugam um flat na Zona Sul (apesar
de alguns irem pra Barra ou Niterói).
Quando não importa de São Paulo
ou Juiz de Fora, a Globo contrata prioritariamente gente que estuda em
faculdades da Zona Sul, como a PUC, da Gávea. Outra faculdade que fornece
bastante gente para o mercado é a FACHA (Faculdades Hélio Alonso), sediada em
Botafogo, Zona Sul. E me formei em jornalismo e publicidade lá.
Dos colegas da FACHA com quem
tive convivência e uma falsa “amizade”, a maioria morava na Zona Sul. Um em Botafogo, outro em Ipanema, outro em Copacabana, duas no Flamengo e três no Catete. Até um professor morava em Ipanema. Hoje,
treze anos depois de formado, ninguém me procura. E quando eu procuro não
respondem. Esqueceram que eu existo. E
eu vou esquecer também.
O Jornal O Globo, sediado no Centro,
sempre prioriza as notícias da Zona Sul. Seus colunistas só tem olhos para lá.
Arthur Xexéo e Arnaldo Jabor adoram contar suas lembranças da juventude na Zona
Sul. A Cora Rónai só resgata os seus gatos e capivaras no Centro ou na Zona
Sul. O Ancelmo Gois e o Joaquim Ferreira dos Santos, em suas colunas, só
mostram os depoimentos e personagens da Zona Sul.
E por falar em memórias, das
panelinhas de fotologs que mostram as fotos do Rio Antigo, só dois falam da
Zona Norte. O restante, principalmente nos comentários, só dá Zona Sul.
Eu já escrevi uma crônica
contando as minhas lembranças de Bonsucesso, mas ninguém se importou. É porque
a Zona Sul é mais bonita, mais cheirosa (exceção da Lagoa Rodrigo de Freitas) e
mais alegre e comunicativa. Dá mais audiência, dá mais IBOPE. É por isso que o
meu sonho ainda é morar lá.
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