—
Sinto muito, ele não vem.
A
noiva, com seu vestido decotado de renda branca, se pôs a chorar em uma tsunami
de lágrimas. Ivan seguiu o seu caminho. Não a conhecia, mas sentiu-se vingado
pelo que fez, sem nenhum remorso.
Afastou-se tranquilamente da multidão de
convidados que a cercaram para consolá-la na porta da igreja. Não era uma
situação inverossímil porque ele tinha falado a mesma coisa para o noivo, que
encontrara meia hora antes, na rua dos fundos da matriz. Aliás, mesma coisa,
não! A crueldade foi mais requintada.
—
Eu vi a sua noiva beijando outro quando passei por ela.
Estava
voltando de uma corretora de valores em Botafogo, onde provocara a demissão de
um ex-colega da faculdade de economia. Foi lá especialmente para dizer os
podres do operador que o ignorava desde a formatura. Mostrou para o diretor um
vídeo, no qual seu então amigo criticava a empresa onde trabalhava, e uma foto
recente dele, tirada de uma rede social, em que o profissional aparecia com
olhos virados de embriaguez e entornando duas tulipas de cerveja. Completou a
vingança com uma acusação de cleptomania.
***
Depois
de frustrar o casamento, Ivan foi abordado por uma mulher grávida. Mais do que
uma simples mulher, aliás. Era uma ex-amiga sua. Ex-colega de ensino médio. Ele
era apaixonado por ela. Agora a moça estava lá, barriguda de seis meses e
esperando um filho de outro homem.
Trabalhando
como repórter em um canal de televisão, ela o chamara para lhe dar uma opinião
sobre uma matéria que fazia. Ivan ficou tão nervoso e frustrado pelo estado da
conhecida, que a empurrou para espantá-la e não dar a entrevista. Ela caiu e
perdeu o bebê. Foi socorrida pelo cinegrafista e a produtora, enquanto Ivan
embarcava no ônibus que o levaria para o bairro do subúrbio onde morava.
Dentro
do veículo, uma criança de uns dois anos brincava e o irritava. Falava alto e
dava gritinhos quando ria. Ivan foi engolindo a raiva. Ouvia a mãe mandar o
filho parar de gritar. No quinto grito, ele estourou.
—
Dá pra calar a boca?!
—
Quem é você para dar ordens no meu filho?! Indignou-se a mãe, enquanto o filho
chorava.
—
Alguém que está cansado de ouvir essa criança chata piando como uma maritaca.
—
Quem cuida do meu filho sou eu. E só por causa disso vou deixá-lo gritar quando
quiser! Mal-educado! Grosso! Esúpido! Os incomodados que se mudem. Se quiser,
pega outro ônibus.
E
foi isso mesmo que Ivan fez. Sob vaias dos outros passageiros. Pegou outro
veículo dez minutos depois. Neste intervalo, viu, no ponto, um jovem casal de
namorados. A moça era loura, cabelos curtos. O rapaz era negro, forte. Disparou
para ele:
—
Ela te contou que é casada?
—
Não! Sério? Estranhou o rapaz assustado.
—
Seríssimo.
—
Vagabunda! Está tudo acabado! Gritou, esbofeteando a moça.
—
Você vai acreditar nesse louco que nunca viu a gente na vida? Quem está
acabando o noivado sou eu! Você confia mais nos outros do que em mim!
E
enquanto o casal discutia, chegou o segundo ônibus de Ivan,
mais vazio do que o primeiro. Sacou o celular e fez uma ligação.
—
Aqui quem fala é um amigo. Presta atenção na sua mulher que ela está te traindo
com o seu melhor amigo.
E
desligou o telefone. Ajudou um cadeirante a entrar no ônibus pelo elevador. E
na saída, ajudou um idoso a descer.
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