Eu
estava sentado na escada que dá acesso à praia, quando um rapaz de uns trinta
anos aproximou-se de mim.
Meu
cigarro estava quase no fim, com uma grande parte de cinzas presas ao corpo.
Estava segurando-o fazia um bom tempo sem dar uma tragada. Após mais de
cinquenta anos com esse hábito, você meio que não dá muita bola. É mais um
hábito do que uma necessidade.
Ele
chegou mais perto e sentou-se ao meu lado.
“Oi,
como vai? Pode me emprestar o isqueiro?”
Eu
levei a mão desocupada ao bolso da camisa e peguei o acendedor.
“Aqui.”
“Valeu...
Então, só apreciando a paisagem? Sempre que eu posso dou uma saída do trabalho
pra vir aqui. Nem gosto de mergulhar.”
Ele
disse isso enquanto tirava um cigarro do maço e colocava entre os lábios. Eu
não prestei muita atenção em suas frases, por estar perdido nas lembranças de
quando eu era mais jovem que a sua presença ativou.
Lembranças
de antes de vir morar aqui, no litoral, para que as lembranças de minha querida
esposa não se esvaíssem com o tempo. Pensei nos finais de semana e feriados em
que passávamos juntos, com nossos filhos pequeninos, tomando água de coco e
fazendo castelos de areia, ali mesmo. Mas agora os tempos eram outros. Os
pequeninos cresceram, foram trilhar seus próprios caminhos e minha esposa já não
está mais aqui.
“É
ainda melhor quando está vazia.”
“Concordo”,
disse ele.
Não devia ter vindo morar aqui, todos
diziam para mim, tem que continuar a
viver!, outro exclamava dando ênfase e levantando as sobrancelhas esperando
que eu concordasse com o seu pensamento.
Muitas
memórias, muita nostalgia, muita alegria, mas agora...
O
rapaz, após algumas baforadas, encostou os braços nas escadas atrás dele e
sorriu. Quando tinha essa “joviedade” fazia exatamente o mesmo: relaxar, sair
da rotina. Ao vê-lo desse jeito não me contive e sorri também.
Mas
não pensem que estou morto, pois não estou. Que sou um velho amargo, alienado,
que se arrepende das coisas que fez ou que não fez. Que tem um fim de vida
cheio que rabugice e rancor. Às vezes, tenho esses momentos nos quais a
nostalgia toma conta, mas até que gosto quando isso acontece. Afinal, quando se
chega aos oitenta, há mais do que se passou do que o que ainda está por vir.
Vou ao clube quase todos os dias. Danço e me divirto como posso. Não dou
trabalho a ninguém, não deixei que me tornasse um fardo para aqueles que se
importam comigo. Visito-os no natal e no ano-novo e é o suficiente.
Sem
tirar os olhos das águas o rapaz diz de um modo profundo, vindo do coração.
“Nunca
me canso de ver isso. As águas indo e vindo.”
“É...
Eu também, garoto... Eu também...”
Conto de Lucas Beça
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