Conto de Gustavo do Carmo
“Você
ainda é muito verde para a função.” Amarildo sempre ouvia isso. Desde procurar
emprego até conquistar mulheres. O problema é que Amarildo já tinha 35 anos.
Idade mais do que madura. Mas estava sempre verde. Sempre amarelava nas horas
mais importantes.
Cursou
jornalismo. Não fez estágio porque seu currículo ainda era muito verde para ter
chances de uma vaga. No final do curso, estava verde porque não tinha
experiência. Formou-se verde e branco. Branco de virgem no mercado e também no
sexo.
Exigente, paquerava as mulheres mais bonitas que conhecia. Ainda era muito verde para conquistá-las. Uma vez, quase conseguiu. Marcou encontro com uma amiga. Mas amarelou quando descobriu que ela tinha um filho pequeno.
Fez
cursos de informática, jornalismo online e assessoria de imprensa. Amadureceu
(somente um pouco) o seu currículo. Mesmo assim, ainda foi considerado verde
para entrar no mercado de trabalho.
Brasileiro
nacionalista, Amarildo se recusava a aprender outras línguas e não retomou o
curso de inglês que tinha largado aos quinze anos. Por isso, seu inglês ainda
era verde.
Desde
os vinte anos, Amarildo tentou ocupar o seu lugar no mercado de trabalho. Aos
vinte e três, já com os certificados dos cursos que fez, tentou mais uma vez.
Não conseguiu. Ainda estava verde para a função.
Chegou
a fazer um teste de vídeo. Além de desarrumado, gaguejou e falou com a língua
presa. Sua voz também era horrível. Fez nova faculdade (agora de publicidade) e
batalhou para conseguir estágio. Continuava verde.
Tentou
ser vendedor de carros, sua paixão. Verde. Atendente de telemarketing. Verde.
Plantonista de clipagem. Verde também. Tentou ser escritor. Mandou originais de
um romance para várias editoras. Todas recusaram. O aspirante a escritor ainda
tinha um texto muito verde.
Amarildo
amarelava nas poucas entrevistas de estágio em que era chamado. Amarelou em uma
oferta de estágio porque estava viajando. Amarelou até na avaliação de
desempenho do Banco do Brasil. Ele tinha sido aprovado no concurso público que
seu pai lhe obrigara a fazer. Mas amarelou no período de experiência. Resolveu
pagar para publicar o seu primeiro livro. Ainda muito verde. Amarelou na hora
de divulgar.
Tentou
tirar carteira de motorista. Fez todas as aulas obrigatórias. Passou na prova
escrita com louvor. Também se saiu bem no exame psicotécnico. Na hora da
prática, ainda se sentia verde para fazer o exame final de direção. No dia da
prova, quando achou que estava maduro, amarelou.
E
por que Amarildo chegou aos 35 anos verde e amarelando sempre? Deprimido com
tantas amareladas e de ser considerado verde, ele procurou um psicólogo.
Descobriu que tinha transtorno de ansiedade e déficit de atenção. Além de uma
grande resistência em amarelar. Amarelar no sentido de amadurecer.
Um
dia, Amarildo amanheceu verde de enjoo. Foi ao médico e descobriu que os seus
olhos estavam amarelos. A pele, com manchas azuladas. Meses depois, morreu de
hepatite. Branco de virgem e de medo. Ficou cinza. Apodreceu em vez de
amadurecer.
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