Conto de Gustavo do Carmo
Neguinho da Beija-Flor - Foto ilustrativa, sem ligação com o personagem do conto |
Sambódromo
lotado. Arquibancada e todos os componentes da escola cantando o samba-enredo.
Os destaques começam a rebolar nos queijos a 10 metros de altura. A madrinha de
bateria, de topless, também já samba e faz reverência aos ritmistas,
disciplinados pelo Mestre Turcão. E o intérprete Ari do Pandeiro, cujo
verdadeiro nome é Aristênio Soares, faz
o seu gargarejo antes de dar o seu grito de guerra.
Ele
cospe o preparado de própolis e gengibre num balde. Estava meio gripado nos
últimos dias. Mas achava que poderia puxar o samba sem problemas. Conseguiu dar
o grito de guerra: SAI DA FRENTE QUE A UNIDOS DA DEMOCRÁTICOS TÁ CHEGANDO!!!! SORRIIIIIIIIIIIA
PANDEIRO!!!!!!
Foram
as últimas palavras que Ari conseguiu soltar. Depois delas ficou sem voz. O
cavaquinho continuou tocando, mas o samba não entrava. O presidente da escola
se desesperou. Ari, tenso, falava com o fiapo de voz que lhe restava:
—
eu
não estou conseguindo nem falar.
Enfim,
o grupo de puxadores auxiliares assumiu o samba, que foi levado até o fim em
coral. A Unidos da Democráticos foi aplaudida ao fim do desfile. Na
quarta-feira de cinzas, descobriu que perdeu pontos em harmonia, evolução,
samba-enredo e conjunto. Ficou em sexto lugar. Voltou ao sambódromo, na semana seguinte, para o desfile das campeãs. A
voz de Ari ainda não tinha voltado. A escola foi mais uma vez aplaudida.
Aristênio
Soares ficou mudo de vez. Mesmo não precisando mais dele e efetivando o coral
de intérpretes, Ari do Pandeiro foi mantido para ser um talismã. Foi demitido
porque nem pra isso ele serviu. A Unidos da Democráticos foi rebaixada no
carnaval seguinte.
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